Distribuição de JCP e dividendo será 9% menor no semestre

Distribuição de JCP e dividendo será 9% menor no semestre

O conteúdo a seguir é de autoria e direito intelectual do portal Valor Econômico.

A tendência de alta no pagamento de dividendos e de juros sobre capital próprio pelas companhias abertas que se observava no início de 2023, com recorde de R$ 61,3 bilhões até abril, perdeu ritmo. Com os proventos anunciados até aqui, os investidores vão embolsar um volume 9% inferior neste primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado. Conforme mapeamento da fintech Meu Dividendo para o Valor, o total deve chegar a R$ 114,9 bilhões, ante os R$ 125,2 bilhões distribuídos entre janeiro e junho de 2022, ano que foi recorde.

Ainda assim, é uma cifra superior à da primeira metade de 2020 e 2021, na fase sob influência da pandemia de covid-19.

A queda de lucros do setor financeiro, da Vale e o pé no freio de outras companhias, como JBS, Suzano e Brasken, explicam o recuo do volume distribuído. O alto custo do endividamento tem feito algumas empresas reterem lucro, cita Wendell Finotti, CEO e fundador da Meu Dividendo. “O cenário de juros elevados faz com que as empresas segurem caixa. Entre ir para o mercado de capitais e levantar dívida, algo oneroso, o melhor é diminuir a distribuição de dividendos, é natural.”

O resultado da Vale, que representa quase 25% das distribuições das companhias listadas, sofreu impacto da queda das cotações do minério de ferro no mercado internacional – e pagou 43% menos em 2023. As exportadoras de carnes atravessaram a suspensão das vendas para a China no começo do ano, enquanto a Braskem está no meio de uma disputa pela aquisição da empresa, descreve Finotti. O que está sendo pago agora é referente aos lucros do último trimestre de 2022 e ao primeiro de 2023.

As companhias também estão levando mais tempo para distribuir seus resultados. Na média, foram 72 dias para remunerar os investidores neste primeiro semestre, após a publicação das demonstrações financeiras. Em 2021 e 2021 foram 58 e 50 dias, respectivamente.

Entre estrategistas de ações e gestores de recursos, há dúvidas se as companhias vão acelerar o passo no segundo semestre tendo em perspectiva as mudanças tributárias adiante ou mesmo a queda da Selic. Outro ponto de interrogação é se a estatal Petrobras continuará sendo generosa no desembolso de proventos, diante das pressões do governo para mais investimentos.Talvez só a partir de 2025 é que ‘yied’ compense renda fixa; vale olhar potencial de alta da companhia” — Ricardo Peretti

Com o JCP sob os holofotes para engordar a arrecadação federal, houve um aumento da distribuição de lucros nesse formato. Comparando-se os primeiros seis meses de 2023 com o mesmo intervalo de 2022, houve um incremento de 41% no volume pago via JCP, representando 39% do bolo, ante 26% até junho do ano passado. Pela regra atual, as empresas podem abater os valores da base de cálculo de imposto de renda, reduzindo o lucro tributável, com uma economia de 34% no que têm a pagar. A conta fica com o acionista, que é tributado em 15% na fonte, enquanto nos dividendos ficaria isento – a reforma pode acabar com esse benefício também.

Pelo consenso de mercado capturado pela Bloomberg, as projeções para o retorno em dividendos, o “dividend yield”, apontam 5,7% no agregado deste ano e 4,6% em 2024 na amostra que inclui Petrobras. Ao se retirar a estatal, a rentabilidade com proventos fica praticamente estável nos dois exercícios, em 4,3% e 4,2%, aponta Ricardo Peretti, estrategista da Santander Corretora. Pela sondagem dos analistas da casa, as empresas, de uma forma geral, ainda não falam em mudanças na política de distribuição por conta de potenciais mudanças tributárias ou do esperado ciclo de corte da Selic.

“Se o barulho [com a reforma] aumentar, pode ser que algumas empresas se antecipem e distribuam algum extraordinário”, diz Peretti. “Do lado dos juros, menos despesa financeira significa potencialmente mais espaço no balanço para distribuir, mas alguma mudança na política tende a ser mais para 2024 do que no segundo semestre de 2023.”

O especialista fez um exercício de sazonalidade e observa que há uma concentração de distribuição de resultados entre abril e maio, com menor recorrência de ações que ficam “ex-dividendos” no segundo semestre. Normalmente, são as companhias de açúcar e álcool que deixam a maior parcela da distribuição para a segunda metade do ano, caso de Jales Machado e São Martinho, alguns casos do setor financeiro, como BB Seguridade, BTG Pactual e Cielo, com as demais seguindo o próprio cronograma, cita.

Para a Petrobras, o ponto de interrogação está na hipótese de a estatal atravessar a oferta da Unipar e outros interessados para assumir a Braskem, na qual já tem participação. Na corretora do Santander, os analistas calculam um dividend yield em 13,1% para a estatal neste ano, enquanto o consenso do mercado está na casa dos 20%, tomando-se como base os 5% do primeiro trimestre e que seriam repetidos nos demais. “Entrou uma nova gestão, mas acho que não tem por que correr em relação ao tema. Se não for igual ao primeiro trimestre, talvez seja próximo. Há uma certa subjetividade, nossos analistas estão sendo mais conservadores, por isso os 13,1%. Eu imagino que esse seja o piso.”

Percepção semelhante tem Luiz Fernando Araújo, CEO da Finacap Investimentos, até porque o próprio governo depende dos dividendos para equacionar o quadro fiscal. “Não dá tempo. Uma companhia de petróleo para desenvolver projetos na escala que seja relevante para a geração de caixa não é tão rápido assim. Este ano ainda vai ter dividendo interessante, o ‘pay out’ [a fatia do lucro distribuída] em 50% ainda é realista para 2023 e 2024, a não ser que tenha alguma aquisição grande.”

A política de dividendos é uma parte importante do filtro fundamentalista que a gestora faz para eleger os papéis com maior potencial para o seu fundo de ações, diz Araújo. Retornos em dividendos entre 5% e 10% ao ano são considerados atrativos na composição dos ganhos potenciais para a carteira.

“Tem que ser, principalmente, consistente ao longo do tempo para entrar no escopo de empresa elegível e tem que ser compatível com a geração de caixa. Depende também do preço, porque quando está defasado tem situações absurdas de um yield de 40%”, afirma Araújo. O gestor acrescenta que a avaliação não é só do ponto de vista financeiro. “O dividend yield é um indicativo do alinhamento com o acionista da empresa, reflete a qualidade da gestão.”

Pelo comportamento das cotações das commodities no mercado internacional, o executivo considera que as distribuições de lucros até podem ficar mais magras ao longo de 2023, mas vai ser muito no caso a caso. CSN, com alavancagem alta, tende a desacelerar, enquanto a Gerdau, que foi mais conservadora no ano passado, talvez tenha capacidade de distribuir mais.

As elétricas, com um fluxo estável de receitas, tendem a manter a recorrência de pagamentos em geral. Mas com concessões à venda, distribuidoras com controle estrangeiro podem ter políticas de dividendos menos agressivas, prossegue Araújo.

Para Peretti, da Santander Corretora, salvo algumas distorções, um dividend yield considerado bom fica no intervalo de 7% a 10%. “É suficiente para bater a Selic [em 13,75% ao ano]? Não. Talvez só a partir de 2025 é que vai compensar a renda fixa. Numa estratégia de dividendos, além do provento em si, prefiro olhar os fundamentos, o potencial de alta da companhia.”

Na Neo, os dividendos são um dos pilares na composição do agregado de resultados, diz o gestor Matheus Tarzia. Mas para os papéis que tem em carteira hoje, não devem ser o grande fator de retorno, diz, porque a casa tem privilegiado teses domésticas, que podem se beneficiar do ciclo de queda de juros.

A Apex não tem se orientado por dividendos, mas com as ações que tem no fundo hoje, espera um aumento de renda vindo dessa fonte, diz o gestor Fabio Spinola. Tem na carteira, por exemplo, Banco do Brasil ON, que tem sido um dos maiores pagadores da bolsa, “além de estar muito barato também”, diz.

Com a fase de baixa captação dos fundos de ações, o dividendo recheia o caixa dos gestores de fundos e permite aproveitar oportunidades, aponta representante da área de relações com investidores de uma asset dedicada a estratégias de bolsa.

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